Capelinha do Recanto do Vô Miro: um pequeno museu preservado - Foto: Danilo Martins/OBemdito

Colunistas

Pequeno museu a céu aberto, primeira capelinha rural de Umuarama está sendo restaurada

Construída em 1956 com tábuas de peroba, obra guarda uma imagem da Nossa Senhora Aparecida de mais de 90 anos

Capelinha do Recanto do Vô Miro: um pequeno museu preservado - Foto: Danilo Martins/OBemdito
Pequeno museu a céu aberto, primeira capelinha rural de Umuarama está sendo restaurada
Graça Milanez
OBemdito
9 de julho de 2023 12h35

De pai para filho, depois para os netos, agora para os bisnetos e ela continua exibindo sua importância para a família Uliana: a capelinha Nossa Senhora Aparecida reina absoluta em meio à paisagem verde do Recanto do Vô Miro, sítio de seis alqueires a poucos quilômetros do centro de Umuarama. Construída há 67 anos, tem quinze metros quadrados de muito charme e forte aura telúrica.

O idealizador, Alberto Uliana, logo que chegou em Umuarama em 1954 realizou o sonho de construí-la no seu sítio para os encontros religiosos da família com vizinhos. O pioneiro veio com a mulher Regina Palu Uliana e nove filhos de Arapongas para se estabelecer por estas terras ensolaradas, com o objetivo de cultivar café.

Capelinha está em meio ao verde da natureza

Dois anos depois, em 1956, a capelinha erguida com tábuas de peroba já era realidade. Catalogada, à época, na Paróquia Nossa Senhora de Fátima de Cruzeiro do Oeste e na então Capela São Francisco de Assis de Umuarama [hoje Paróquia], ela foi palco de muitas missas, batizados, casamentos, catequese e, claro, quermesse [também foi onde o famoso Padre Machado, de Umuarama, servia como coroinha].

Atualmente quem zela por ela é o neto, Sidney José Uliana, 65 anos, com ajuda da esposa Ivete Todero Uliana; o casal está empenhado em restaurá-la. Eles receberam a reportagem de OBemdito para contar as histórias que permeiam o projeto do avô.

Sidney Uliana, neto do idealizador da capela: orgulho do avô

“Temos alguns problemas para solucionar, mas nada muito preocupante! Uma janela está sem vidro, mas não por desleixo; é que não estamos encontrando um vidro com as mesmas características do original para repor”, explica Sidney.

Janela com vidro quebrado: problema de difícil solução

Nesse processo, a capelinha terá sino novamente, por doação de uma empresária. “O original foi roubado”, lamenta. Também por doação a capela deverá em breve receber de volta o assoalho de madeira [hoje o piso é de cimento]. “Tem muita gente ajudando e querendo ajudar”, comemora Sidney, em tom agradecido.

Outro desejo é recadastrá-la. Se conseguir, fará parte da Paróquia Santa Clara, do Jardim Cruzeiro. “Assim, terá sua importância restaurada, também”, acredita Sidney.

“Ultimamente nossa capela está sendo bastante prestigiada: recebemos muita gente aqui no sítio, que vem exclusivamente para conhecê-la, além dos que vêm para rezar o ‘Terço Sagrado por Maria’ conosco”.

Pequeno museu

Na arquitetura da capela Nossa Senhora Aparecida do Recanto do Vô Miro a simplicidade confere beleza. Chama a atenção na fachada o lambrequim e o desenho de uma cruz feita com furos. Dentro, há imagens de santos, como toda casa de oração católica. O destaque fica para a imagem de Nossa Senhora Aparecida, adquirida pelo avô de Sidney em 1933.

Fachada com a cruz desenhada com furos e à frente uma araucária: no início existiam duas dessa espécie; replantio faz parte da restauração – Fotos: Graça Milanez

Naquele ano, Alberto Uliana morava em Cedral/SP e foi para o Santuário de Aparecida do Norte para rezar. “Nessa viajem de cerca de 600 quilômetros, feita de trem, comprou a Santa e guardou na casa dele até o dia em que construiu a capela para colocá-la no altar”, relembra Sidney. “A extrema devoção do meu avô à Santa foi o que o motivou a dar o nome dela à capelinha”.

“Esta imagem tem quase cem anos! E está em ótimo estado de conservação! Imagine nossa responsabilidade para com ela?”, indaga, refirmando sua disposição de continuar cuidando muito bem da relíquia.

Sidney Uliana e a imagem de Nossa Senhora Aparecida, que o avô comprou na década de 1930 – Fotos: Graça Milanez

Em seu interior, o pequeno templo confere também um toque de museu da família: nas paredes estão expostas as fotos dos casais Uliana Regina, falecida em 1983, aos 83 anos, e Alberto, falecido em 1976, aos 78 anos; e Antônia Fabem Uliana, falecida no ano passado, aos 89 anos, e Waldomiro, falecido em 2016, aos 83 anos.

Homenagem aos pais e aos avós

No conjunto, tem ainda um quadro com a fotografia do irmão de Sidney, o professor Clóvis Uliana, falecido em novembro do ano passado. “É uma homenagem para ele, já que gostava tanto dessa capelinha!”.

Quadro com foto de Clóvis Uliana: homenagem ao irmão de Sidney Uliana – Foto: Graça Milanez

Sidney avisa que vai manter nesse pequeno museu várias ferramentas que eram utilizadas no período de colonização da propriedade, para conhecimento das pessoas mais jovens. 

Brasão da família Uliana faz parte do pequeno museu

Outras histórias 1

Sidney conta que seu pai, Waldomiro Uliana, ajudou na construção da capela: “Meu avô contratou um carpinteiro muito competente naquele tempo, o ‘seu’ Genésio, mas tanto ele, quanto os filhos ajudaram… em cinco dias concluíram; meu pai teve a sorte de herdar a área de terra onde foi construída a capela”.

Ele lembra que o sítio do avô tinha uma olaria que produzia tijolos e vendia para toda a região; aliás, muitos terreiros de café eram feitos com os tijolos produzidos pela família Uliana.

Mas veio a ‘geada negra no ano de 1975’ e a paisagem foi mudando, bruscamente. Seus tios migraram uns para a cidade de Umuarama e outros para o estado de São Paulo; meu pai ficou em Umuarama.

“Meu pai morou aqui no sítio até o ano de 1966; com o declínio das lavouras, teve que ir para a cidade, onde conseguiu emprego de ensacador, mas o sítio continuou produzindo café até 1986, pelos porcenteiros”, conta Sidney.

“Meu pai foi trabalhar numa empreiteira de energia chamada SAAD e em 1968 foi convidado para trabalhar na Copel, onde trabalhou por anos na função de eletricista; era muito responsável e eficiente na sua função, ajudando a instalar as redes de energia elétrica de alta e baixa tensão na área urbana e rural da região toda”, orgulha-se o filho de Miro.

Outras histórias 2

A consciência do ‘seo’ Alberto em promover socialização da comunidade da qual fazia parte foi além da religião. Ele também se preocupou com a alfabetização. Sidney rememora mais uma boa história, relacionada à liderança do avô.

“Vendo que os filhos dele e das famílias que trabalhavam nas lavouras de café, que eram muitas, necessitavam ser alfabetizados, meu avô e os vizinhos formaram uma comissão para propor ao prefeito a construção de uma escola, o que demonstra o quanto ele era à frente do seu tempo”, descreve Sidney.

Segundo ele, a comitiva foi até a cidade de Cruzeiro do Oeste e conversou com o então prefeito Aparício Teixeira D’Avila, que recebeu a proposta: a comunidade construiria a escola e a prefeitura pagaria a professora. Assim foi feito. “Juntos construíram a escolinha na divisa da propriedade do meu avô com a família Stecca, denominada ‘Sala de Aula Machado de Assis’; foi uma das primeiras escolas rurais do então distrito de Umuarama. Anos mais tarde, com a criação do município de Umuarama, passou a se chamar Escola Municipal Rural Machado de Assis, oferecendo ensino primário.”, relata Sidney.

Participe do nosso grupo no WhatsApp e receba as notícias do OBemdito em primeira mão.