Rudson de Souza Publisher do OBemdito

Após decisão da Justiça, ocupação persiste e impasse segue na Fazenda Santa Fé

Após decisão da Justiça, ocupação persiste e impasse segue na Fazenda Santa Fé
Rudson de Souza - OBemdito
Publicado em 31 de dezembro de 2025 às 11h56 - Modificado em 31 de dezembro de 2025 às 14h45

Mesmo após a expedição do mandado de reintegração de posse pela Justiça do Paraná, famílias ligadas a movimentos sociais ainda permaneciam na Fazenda Santa Fé, em Xambrê, até a manhã desta quarta-feira (31). Embora algumas famílias tenham deixado a área desde a decisão judicial, um número ainda considerado significativo de pessoas segue no local, mantendo a ocupação iniciada no último sábado (27).

A área rural, localizada na Estrada Cascata e com 942 hectares, é administrada pela Associação Colaboradores do Brasil (Colab) e foi ocupada por cerca de 250 pessoas vinculadas à Frente Nacional de Luta Campo e Cidade (FNL) e ao Movimento Terra e Alimento (MTA). O impasse ocorre mesmo após decisão liminar do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), que determinou a reintegração imediata da posse em favor da entidade.

Mandado expedido, mas ainda não cumprido

Na noite de segunda-feira (29), a juíza Polyanna Tamaio Zanineli, da Unidade Regionalizada de Plantão Judiciário de Umuarama, expediu o mandado de reintegração de posse, autorizando o oficial de Justiça a retomar a área e, se necessário, requisitar reforço policial. Até a publicação desta reportagem do OBemdito, no entanto, o mandado ainda não havia sido cumprido, e o oficial de Justiça não havia ido à fazenda.

A decisão judicial determina a reintegração da Fazenda Santa Fé, composta por áreas registradas sob diversas matrículas imobiliárias, além da citação formal dos movimentos e de integrantes identificados, com prazo de 15 dias úteis para apresentação de contestação.

Movimentos judiciais da defesa

Após a liminar concedida pelo TJ-PR, a representação jurídica dos movimentos ingressou com embargos de declaração, que ainda não haviam sido apreciados. Também foi impetrado um mandado de segurança, cuja liminar foi negada.

Advogada dos movimentos, Amanda Mackert dos Santos informou que a defesa segue utilizando todos os instrumentos legais disponíveis e reforçou que a permanência das famílias está amparada em fundamentos humanitários e constitucionais.

Whatsapp Image 2025 12 30 At 10.05.18 (1)
Famílias ligadas a movimentos sociais permanecem na área ocupada da Fazenda Santa Fé (Foto Vagner Delaporte/OBemdito)

Em carta pública divulgada nesta quarta-feira (31), a FNL e o MTA afirmaram que a resistência no local é pacífica e que não há intenção de confronto.

O documento sustenta que a decisão judicial desconsidera protocolos previstos na ADPF 828 do Supremo Tribunal Federal e na Resolução nº 510/2023 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que tratam da mediação prévia em conflitos fundiários coletivos.

“Ainda não se esgotaram os prazos recursais, ainda não foi julgada a última palavra da Justiça e, sobretudo, o Incra já manifestou interesse oficial na compra da área para fins de reforma agrária”, afirma o texto, que pede diálogo institucional e suspensão de qualquer ação coercitiva.

Leia também: Famílias seguem na Fazenda Santa Fé enquanto defesa recorre e Incra avalia compra

Possível compra pelo Incra

A sinalização do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) foi feita durante reunião extraordinária da Comissão Estadual de Mediação de Conflitos Fundiários (CE-MCF), realizada na tarde de segunda-feira (29).

No encontro, o superintendente regional do Incra no Paraná, Nilton Bezerra Guedes, informou que a autarquia reconhece a reivindicação das famílias e que, havendo interesse dos proprietários, a área pode ser adquirida por meio de compra e venda, conforme previsto no Decreto nº 433/1992.

A comissão deliberou pelo encaminhamento do caso à Comissão de Soluções Fundiárias do TJ-PR, com o objetivo de buscar uma saída mediada e evitar o agravamento do conflito.

Whatsapp Image 2025 12 30 At 10.05.18 (2)
Barracas e estruturas improvisadas seguem montadas na Fazenda Santa Fé, em Xambrê (Foto Vagner Delaporte/OBemdito)

Colab diz confiar na Justiça

A Associação Colaboradores do Brasil informou que não participa de negociações diretas com os ocupantes e aguarda o cumprimento das determinações judiciais. Advogado da entidade, Paulo Cesar de Sousa afirmou que a Colab mantém confiança no trabalho do Judiciário.

“A Colab segue confiante no trabalho da Justiça e no regular cumprimento da ordem de reintegração de posse. Todas as medidas adotadas estão sendo conduzidas pelas vias legais, com respeito às decisões judiciais”, afirmou.

Segundo a entidade, a urgência da reintegração está relacionada, entre outros fatores, à presença de aproximadamente 2 mil cabeças de gado na propriedade, o que, na avaliação do Judiciário, poderia gerar risco de danos aos animais caso o acesso e o manejo permaneçam comprometidos.

PM acompanha e negociações seguem intensas

Desde o início da ocupação, equipes do 25º Batalhão da Polícia Militar, com sede em Umuarama, permanecem na área. Segundo a Secretaria de Estado da Segurança Pública do Paraná (Sesp), a atuação tem caráter preventivo e visa garantir uma eventual desocupação pacífica.

“A Polícia Militar do Paraná permanece no local com o objetivo de garantir a segurança, preservar a ordem pública e evitar conflitos. Até o momento, não houve necessidade de intervenções e nenhuma intercorrência foi registrada”, informou a Sesp, em nota.

Whatsapp Image 2025 12 29 At 16.29.39
Área rural de 942 hectares segue ocupada em Xambrê; Justiça determinou reintegração, mas retirada das famílias ainda é discutida (Foto Vagner Delaporte/OBemdito)

De acordo com interlocutores envolvidos, as negociações seguem intensas entre representantes institucionais, movimentos sociais e órgãos do Estado, enquanto se aguarda o desdobramento judicial e uma definição sobre eventual mediação ou cumprimento da ordem de reintegração.

Nota da Faep

O Sistema FAEP (Federação da Agricultura do Estado do Paraná) divulgou nota em que manifesta apoio à decisão do Poder Judiciário que determinou a reintegração de posse da Fazenda Santa Fé, em Xambrê. A entidade afirmou que a medida reforça princípios como o respeito à propriedade privada, à legalidade e à segurança jurídica.

O presidente da FAEP, Ágide Eduardo Meneguette, defendeu o cumprimento da decisão e afirmou que invasões de propriedades produtivas não podem se sobrepor ao ordenamento jurídico. Segundo a federação, a reintegração deve ocorrer de forma pacífica e dentro dos parâmetros legais, com preservação da integridade das pessoas envolvidas. A entidade informou ainda que acompanha o caso e presta apoio aos proprietários por meio do Sindicato Rural de Umuarama.

Histórico da área

Criada nos anos 1950 por missionários norte-americanos, a Fazenda Santa Fé teve origem ligada a projetos religiosos, sociais e agrícolas.

Registros históricos indicam que o local nasceu do ideal do missionário George Hartley Pidcoke, que pretendia transformar a área em reserva ecológica e orfanato. Uma das construções da fazenda foi erguida com essa finalidade nos anos 1960.

Ao longo das décadas, a propriedade passou a concentrar suas atividades na pecuária de corte. Segundo a Colab, o imóvel já foi alvo de vistorias do Incra, que o classificou como produtivo em análises administrativas anteriores.

Santa Fé 01
Ocupação na Fazenda Santa Fé reúne homens, mulheres e crianças, com presença da Polícia Militar para evitar confrontos e acompanhar negociações (Foto Vagner Delaporte/OBemdito)

Participe do nosso grupo no WhatsApp e receba as notícias do OBemdito em primeira mão.