Defensoria Pública intermedeia acordo e ajuda famílias forçadas a deixar área ocupada em Umuarama
Acordo formalizado garante o pagamento temporário de aluguel para famílias que foram afetadas por ação de despejo
Famílias que há pouco mais de oito meses eram forçadas a deixar uma ocupação em Umuarama conseguiram uma nova oportunidade de moradia por meio da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) e de outras instituições.
Após intervenção da DPE-PR no processo que poderia levar ao despejo total dos ocupantes, a Comissão de Soluções Fundiárias do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR) e o Núcleo Itinerante das Questões Fundiárias e Urbanísticas (Nufurb) da DPE-PR mediaram um acordo que envolveu a Prefeitura Municipal e a empresa proprietária do terreno, além dos ocupantes.
No acordo, as famílias se comprometem a deixar pacificamente o local. Em contrapartida, a empresa pagará o primeiro aluguel do imóvel para onde as pessoas se mudarem, e a Prefeitura será responsável por fornecer um auxílio financeiro a partir do segundo mês.
O benefício deve se estender até que os moradores tenham condições de pagar a despesa. Ao todo, 14 pessoas moravam na ocupação, sete crianças e sete adultos, incluindo uma pessoa com deficiência e um idoso. Parte delas já havia deixado a área.
João Victor Longhi, defensor público e coordenador do Núcleo Itinerante das Questões Fundiárias e Urbanísticas (Nufurb), auxiliou na mediação do conflito. Ele conversou com OBemdito e explicou como foi a atuação da Defensoria Pública e qual a solução encontrada. Porém, antes vamos relembrar o caso.
OCUPAÇÃO
Há cerca de 20 anos três casas localizadas na propriedade de um antigo laticínio, no bairro São Cristóvão, eram ocupadas por um algumas famílias. A situação se tornou um imbróglio judicial, pois o proprietário da área buscava retomar os imóveis e os moradores tentavam permanecer no local através de uma ação de usucapião (adquirir o direito da área em decorrência do longo período de permanência nela).
No dia 22 de novembro de 2023 uma ação de reintegração de posse foi iniciada. A medida foi autorizada pelo juízo da 3ª Vara Cível de Umuarama. O oficial de justiça esteve no endereço e apenas os moradores de um dos imóveis fizeram a desocupação. Um homem, que é portador de deficiência física, sua filha e três netos saíram da casa. Na ocasião, eles foram abrigados pelos outros moradores temporariamente. Após a retirada dos seus pertences, a residência foi demolida.
Diante da relutância de outra moradora em sair do imóvel que ocupava junto com seus filhos, a Polícia Militar foi acionada. Em virtude da presença de várias crianças e do impasse extremamente delicado, a juíza adiou excução da ação de reintegração de posse.
DESPEJO COLETIVO X DEFENSORIA
No dia 24 de novembro de 2023 a Defensoria Pública do Estado do Paraná divulgou que estava acompanhando a situação através do Núcleo Itinerante das Questões Fundiárias e Urbanísticas (Nufurb). À época, a DPE-PR informou que não havia sido notificada previamente. O juízo da 3ª Vara Cível de Umuarama argumentou que não seria necessário notificar a Defensoria antes de cumprir o despejo, pois o pequeno grupo familiar não configuraria uma ocupação coletiva.
A Defensoria recorreu da decisão e pediu habilitação no processo, para buscar impedir que os ocupantes ficassem desabrigados. A instituição entendeu que se tratava de um despejo coletivo. Por isso, fez o pedido de anulação da decisão que autorizou a retirada dos moradores.
O defensor público João Victor Longhi disse na ocasião que era necessária uma audiência de conciliação, que poderia evitar o despejo. Também ressaltou que o Poder Público deveria garantir moradia às famílias, seja por meio da regularização dos imóveis ou através da realocação para imóveis que preservassem a dignidade de todos os envolvidos.
Em 1º de dezembro de 2023 a 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) determinou a suspensão da reintegração de posse após pedido da DPE-PR. Na decisão, a Câmara Cível determinou que a suspensão só poderia ser discutida novamente depois de uma avaliação da Comissão de Conflitos Fundiários do TJPR.
ACORDO FIRMADO
No dia 23 de julho de 2024 a Defensoria tornou público o acordo formalizado para garantir moradia para as famílias. “Esse acordo firmado por meio da cooperação entre as partes e de diversas instituições mostra que o diálogo será sempre o melhor caminho para garantir o direito à moradia digna”, disse Longhi.
Ele acrescentou que “constatado que a realocação das famílias para outro local era necessária, conseguimos oferecer uma solução à proprietária do terreno e um encaminhamento adequado às famílias, evitando que ficassem desabrigadas e em condição ainda mais vulnerável”.
A DPE-PR continuará acompanhando as famílias, sobretudo para fiscalizar o cumprimento do acordo.
ATUAÇÃO DO NUFURB
Em entrevista a OBemdito, Longhi explicou que o Núcleo Itinerante das Questões Fundiárias e Urbanísticas (Nufurb) está tentando intermediar casos semelhantes ao que aconteceu em Umuarama em outros municípios do Paraná. O coordenador do Nufurb estima que quase 30 mil famílias estão nessa situação no estado. “Ninguém vai morar em barranca de rio, em casa abandonada, em terreno irregular por querer. Temos que analisar que existe a vulnerabilidade econômica e a falha do poder público que levam a estas condições mais extremas”, argumentou.
Ao tomar conhecimento de episódios desta natureza, a DPE-PR se habilita no processo e, em nome da Defensoria Pública, atua no interesse de terceiros. “Estamos nos habilitando nesses processos em todo o estado. Atualmente são mais de 100 mil pessoas que podem ser despejadas a qualquer momento apenas no Paraná”, relatou.
Longhi ressaltou que o acordo em Umuarama contou com participação da DPE-PR, da Comissão de Conflitos Fundiários do TJPR, da Prefeitura, do proprietário da área, do Governo do Estado (através da Cohapar) e dos ocupantes que ainda permaneciam dos imóveis.
“Este é um problema social e a Defensoria entrou para ajudar a dialogar e encontrar uma solução diversa do despejo forçado. Na época, uma senhora com filhos estava desnorteada e um senhor chegou a ter um AVC depois da situação. Enfrentamos resistência da juíza local, mas recorremos e conseguimos intermediar essa solução pacífica. A Prefeitura vai pagar um auxílio periódico, que será fiscalizado pela Assistência Social, e o Ministério Público irá acompanhar. Esse apoio é uma situação temporária, até que essas duas famílias consigam se organizar para, por conta própria, pagar seus alugueis ou arrumar outras moradias”, finalizou o defensor público.
(Reportagem: OBemdito e Ascom DPE/PR)