Paraná

Em depoimento à PF, ex-diretor confessa desvios e diz que Pozzobom chefiava esquema criminoso

“Não sei o que ele (prefeito) fazia com tanto dinheiro produto de propina”

Em depoimento à PF, ex-diretor confessa desvios e diz que Pozzobom chefiava esquema criminoso
Leonardo Revesso
OBemdito
1 de dezembro de 2021 15h44

Em depoimento à Polícia Federal no âmbito da Operação Jaborandi, o ex-diretor de Assuntos Institucionais da Prefeitura de Umuarama, Cícero Laurentino, confirmou o esquema de desvio de recursos em obras geridas pelo município, com recursos próprios ou do governo federal, e incriminou diretamente o prefeito Celso Pozzobom.

 “Não sei o que ele (prefeito) fazia com tanto dinheiro produto de propina que lhe era entregue, mas o prefeito Celso sempre teve muitas terras e muito gado, e a maioria de seus bens são registrados em nomes de familiares”, afirmou Laurentino.

O depoimento, que totalizou cinco páginas, aconteceu no dia 17 de novembro, por videoconferência. Laurentino está preso no mini presídio de Campo Mourão desde 5 de maio, quando o Ministério Público deflagrou a Operação Metástase, responsável por investigar outro esquema criminoso, de desvio de recursos públicos do Fundo Municipal de Saúde.

O delegado da PF Mateus Marins Correa de Sá avisou a Laurentino que ele tinha a opção de não responder às perguntas, pelo princípio constitucional de que não é obrigado a produzir provas contra si. Ainda assim, o ex-diretor decidiu falar, contrariando a orientação de seu advogado, Vitor Augusto Esprada Rossetin, que optou por se retirar da sala.

Laurentino minimizou sua participação no esquema criminoso. Disse que as negociações eram feitas diretamente pelo prefeito Pozzobom e os construtores responsáveis pelos contratos. As empresas eram escolhidas antes mesmo da abertura dos processos licitatórios, num jogo de cartas marcadas.

Segundo Laurentino, o ex-assessor parlamentar Valdecir Miester ficava com 10% dos valores de emendas parlamentares destinadas a Umuarama. O dinheiro geralmente era repassado em cheques, pelos construtores. Laurentino cuidava de trocar os valores em dinheiro vivo, com um agiota da cidade. Pela intermediação, disse que ficava com 1% do montante.

O ex-diretor afirmou que Celso Pozzobom conheceu Valdecir Miester em Brasília, no segundo ano de mandato na Prefeitura, em 2018.

“Fio do bigode”

Na época, Miester teria dito ao prefeito que havia muito dinheiro na Capital, mas que encontrava dificuldade de fazer os valores chegarem a Umuarama, situação que poderia mudar, com o apoio de Pozzobom. E fez uma ressalva: teria que ser tudo no “fio do bigode”, expressão utilizada para se referir ao fiel cumprimento do que é combinado.

Na época, Miester atuava no gabinete do então deputado federal Alfredo Kaefer, mas nem sempre utilizava a força do mandato do parlamentar, uma vez que tinha influência no Congresso e até mesmo no governo, notadamente o Ministério do Desenvolvimento Regional.

A primeira transação “bem-sucedida” com as digitais de Miester em Umuarama foi a construção de seis pontes no município. A licitação foi vencida pela WSL Construções Eireli, de titularidade do empresário Wilmar Schmidt Lindenmayer, de Santa Helena. Laurentino disse não se lembrar qual deputado destinou a emenda.

Conforme Laurentino, Miester recebeu de Lindenmayer R$ 200 mil reais pela intermediação, em quatro cheques pré-datados de R$ 50 mil cada. O ex-diretor afirmou ter presenciado a entrega dos cheques, na loja de conveniência de um posto de combustíveis, em Cascavel.

Miester, porém, precisava de dinheiro vivo para levar a Brasília, possivelmente para entregar a quem facilitou o repasse do recurso para o conjunto de obras.

Laurentino se ofereceu a trocar uma das folhas, de R$ 50 mil, com um “agiota” de Umuarama, conhecido como Hermes, e tido como pessoa de extrema confiança de Pozzobom, ao ponto de não fazer nenhuma transação sem a concordância do prefeito.

Prefeito mandava segurar pagamento

Ainda de acordo com Laurentino, quando o empresário não cumpria com os prazos combinados para repassar dinheiro, o prefeito Pozzobom mandava segurar os pagamentos dos serviços prestados. Lindenmayer só poderia receber no dia em que Miester estivesse em Umuarama.

O ex-diretor disse que as tratativas entre Pozzobom, Miester e Lindenmayer eram feitas com bastante frequência dentro gabinete do prefeito. Cícero Laurentino declarou que a grande maioria dos recursos federais recebidos por Umuarama de 2018 até o início de 2021 passaram pelas tratativas de Valdecir Miester.

Quando se tratava de contratos com recursos próprios do município, que não envolviam a figura de Miester, o prefeito ficava com os 10% que costumeiramente iam para o ex-assessor, além de sua parte habitual.

Pavimentação Estrada Jaborandi

Outra obra investigada por fazer parte do provável esquema de corrupção é a da pavimentação da estrada Jaborandi, feita com recursos de emendas conseguidos pelo deputado federal Alfredo Kaefer e recursos do caixa da Prefeitura.

Aqui entra mais um personagem na suposta ação criminosa: Luiz Gabriel de Souza, o Luiz da Sotram. A empreiteira foi a vencedora da licitação. O modus operandi seguia o rito de sempre. Várias empresas participavam do certame, num jogo de cartas marcadas.

Isso facilitava que a ganhadora concedesse descontos menores e cobrasse preços maiores, para garantir os 10% de Miester e outras cifras eventualmente desviadas.

Apenas obedecia ordens do prefeito

Já no final do depoimento, Cícero Laurentino afirmou que na maioria das vezes fazia o serviço de trocar cheques de construtores em favor de Pozzobom sem saber do que se tratava. Apenas obedecia ordens do prefeito.

O ex-diretor também declarou que levou dinheiro até o escritório do advogado Heber Lepre Fregne, então procurador do município. Neste caso, seriam recursos provenientes do Hospital Norospar, objeto de investigação do Ministério Público na Operação Metástase.

OBemdito não conseguiu contato com o prefeito afastado Celso Pozzobom e as outras pessoas citadas na reportagem ou não quiseram se manifestar ou não foram localizadas. O espaço está aberto para as manifestações.

Participe do nosso grupo no WhatsApp e receba as notícias do OBemdito em primeira mão.