Nas áreas descampadas, a trilha antiga virava um canal de barro com as chuvas; e quem tentava atravessar, fatalmente atolava... Foto: Acervo Ítalo Fábio Casciola

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Quando foi anunciada a fundação de Umuarama, uma nova cidade no Paraná… (parte 2)

… começou a chegar gente de todos os lados do Brasil para viver na nova urbe que nascia…

Nas áreas descampadas, a trilha antiga virava um canal de barro com as chuvas; e quem tentava atravessar, fatalmente atolava... Foto: Acervo Ítalo Fábio Casciola
Quando foi anunciada a fundação de Umuarama, uma nova cidade no Paraná… (parte 2)
Ítalo Fábio Casciola
OBemdito
18 de junho de 2023 12h55

Para todos nós, que chegamos em meados do século passado, nas décadas de 1950 e 60, os ventos da esperança de dias melhores começaram a soprar assim que atravessamos as fronteiras do Paraná.

Uns chegavam do Nordeste, outros das Minas Gerais, os paulistas de mais de perto, e até os imigrantes (ou descendentes) que vieram para o Brasil da Europa e da Terra do Sol Nascente. Todos, indistintamente, se encantavam ao ver o Eldorado que estava sendo aberto neste Norte Novíssimo.

Mas, ao passar pelo Norte Pioneiro, depois Londrina e Maringá, já sentimos na alma os desafios que estavam à espera por aqui. De certa forma, isso fortaleceu a vontade de explorar, conquistar, desbravar e trabalhar, afinal, todos acreditavam no poder do labor e as recompensas que ele iria gerar mais tarde na forma de colheitas fartas nas lavouras.

Porém, a beleza e surpresas da paisagem em franco desenvolvimento agrícola e populacional que se via na “Capital do Café” e na “Cidade Canção”, e arredores, mudava bruscamente de Maringá para cá. O tal desafio surgia à nossa frente conforme a viagem avançava para cá, na forma de uma floresta absolutamente fechada, sulcada unicamente pela tal lendária trilha da “futura ferrovia”. Uma imensa área completamente primitiva. Aí sim brotava o medo com a realidade que saltava aos olhos de todos, mostrando que estávamos seguindo para o desconhecido, inseguro, imprevisível e perigoso.

Mesmo depois de ter percorrido centenas de quilômetros depois da fronteira entre São Paulo e o Paraná em estradas de chão, escorregadias pela lama da terra roxa que atolava até os pensamentos e buracos enormes, o pior ainda não havia chegado.

Enfrentar uma mata virgem por todos os lados, percorrendo um túnel formado pelas árvores centenárias e fechadas, era ainda mais aterrador para quem nunca tinha passado por uma aventura dessas proporções. Para as mulheres e crianças, então, foi um assombro!

Basta dizer que o cenário causava pavor até mesmo para os que já viviam nas clareiras abertas pelo Norte Novíssimo afora, que sentiam na pele as agruras de cair num fim de mundo jamais antes explorado.

Imaginem o olhar de espanto para quem vivia em cidades ou campos colonizados décadas antes, onde contavam com uma série de benefícios, mesmo sendo primários, como a energia elétrica, apenas para citar um.

Porém, inconformados com a falta de trabalho e a penúria econômica em que viveram até então em seu torrão natal, os primeiros colonos respiravam fundo e enchiam o coração de audácia para participar dessa odisséia que estava apenas começando no descobrimento deste novo mundo, que se descortinava à frente em pleno seio de uma selva continental.

Atravessar rios, na época em que não havia pontes, só através de balsas; um desafio nas águas do Ivaí, reinando no meio da mata virgem. Foto: Acervo Ítalo Fábio Casciola

Ônibus, caminhões carregados de mudanças e até mesmo carros de passeio com os bagageiros cheios de tralhas, traziam famílias para esta nova fronteira que surgia.

Mas… antes de começar uma viagem que seria absolutamente inesquecível para todos os que participavam dessa loucura, os motoristas paravam nos arredores de Maringá, num amplo descampado que existia, onde havia algumas churrascarias, hotéis e botecos, postos de gasolina e borracharias. Todos rústicos, de aparência feiosa e com quase nenhum conforto a oferecer aos viajantes.

Naquele lugar faziam uma longa pausa, um dia e uma noite inteira, armazenando coragem e energias para enfrentar um desafio titânico: cortar a floresta percorrendo um sendeiro acidentado e imprevisível no coração da selva de outrora.

Para quem vinha para Umuarama, ou paragens próximas, os velhos e experientes motoristas já iam avisando dos terríveis sacrifícios que todos teriam que enfrentar. Portanto, o conselho era descansar bastante, se alimentar bem, especialmente para quem tinha na família crianças e velhinhos.

E vinha o alerta: depois de iniciar o percurso da trilha, não haveria mais volta, a ordem era parar no ponto final da expedição, ou seja, Umuarama, ou qual fosse outro destino escolhido pelos viajores.

Quando chovia, ônibus e passageiros atolavam até a alma no barro… Foto: Acervo Ítalo Fábio Casciola

Até acampamentos eram improvisados naquela área de Maringá, para aqueles que não podiam pagar hotel ou pousadas. Era preciso descansar bem, pois a viagem que viria a seguir poderia demorar uma noite e um dia inteiro, caso não chovesse. Do contrário, aí o futuro a Deus pertencia…

O mesmo ocorreria se um veículo – ônibus ou caminhão –  quebrasse no meio do trajeto. Valia ainda rezar para que ninguém ficasse doente, porque não encontraria hospitais nem médicos. Portanto, todos sabiam de antemão que, quando chegassem ao lugar desejado, poderia ter a certeza de que acabavam de cometer um ato de heroísmo, algo sobre-humano, com provas incontáveis de resistência física e emocional. Certamente, passariam por uma aventura antes nunca experimentada em suas vidas. Atualmente, um percurso assim é inimaginável, certamente chamariam de “Missão Impossível”… (ITALO FÁBIO CASCIOLA)

Confira a parte 1 aqui.

Um passado impossível de esquecer: Trilha marcada por viagens memoráveis atravessando um mundo verde cheio de mistérios e surpresas… Foto: Acervo Ítalo Fábio Casciola
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