Ítalo Fabio Casciola

As poucas reservas verdes que restaram da destruição no passado, correm perigo!!!

É melancolicamente incrível que, depois de quase um século, ainda continuem acontecendo crimes ambientais no Paraná e nossas reservas verdes corram perigo. Depois de tanto tempo em que “executaram” milhões de árvores aqui neste território do Noroeste, para a fundação de Umuarama e cidades vizinhas e de incontáveis áreas para as fazendas que dariam origem à riqueza com a cafeicultura, e contando com severa lei para impedir esses crimes, as derrubadas de matas continuam ocorrendo e sendo manchetes na mídia paranaense…

Casos de desmatamento ilegal ainda são registrados. Inúmeras denúncias de desmatamento ilegal no Paraná continuam a ocorrer. Embora dados recentes do governo e de ONGs indiquem uma tendência de queda significativa nas taxas gerais de desmatamento no Estado. A percepção de que “sempre aparecem” denúncias reflete a persistência do crime ambiental, mas o volume total de área desmatada tem diminuído.

O desmatamento ilegal é considerado crime ambiental, sujeito a penalidades administrativas e processo criminal. Aproveito este momento para registrar a existência da Lei de Crimes Ambientais (Lei Federal nº 9.605/98). Mas é preciso estar atento para essas ocorrências e fazer as denúncias de extinção das reservas verdes!!!

Vale esta crônica para recordar a terrível devastação que eu e toda a minha geração assistimos nos anos 1950 a 1980 aqui nesta imensa área ao redor de Umuarama. Os jovens desta nova geração, hiper moderna abraçada à tecnologia e ao futuro, precisam conhecer como foi horrível a completa e arrasadora “limpa” que fizeram.

A devastação atingiu milhões de quilômetros quadrados para implantar novas cidades e dar início com devoção à cafeicultura e à pecuária. Sem contar ao surgimento do mercado imobiliário para vender terrenos e construir casas e estabelecimentos comerciais aqui nesta Capital da Amizade e em todas as cidades que estão no mapa do Noroeste.

Os famosos “caminhões de toras”, o veículo de transporte dos tempos em que todo o território que antes era coberto de milhões de árvores de todas as espécies mais usado no trajeto floresta X serrarias!!!

“Madeeeeeeeeeeeeeiraaaaa!!!”… O grito, o ranger da árvore e o estrondo do tombo!!!

Quem vive e desfruta hoje desta Umuarama tão decantada como moderna, confortável e pujante, não tem a mínima ideia da aventura fabulosa que foi a abertura do território. Os pioneiros foram rasgando uma imensa clareira no coração de uma imensa floresta para “plantar” uma cidade e uma promissora nova fronteira agrícola.

Dessa rica história não pode faltar o dia-a-dia da devastação da rica mata virgem. Na época, uma legião de desbravadores armados de machados e possantes motoserras foi dizimando, uma a uma, as majestosas árvores das mais variadas espécies da nossa reserva verde.

Entre as preferidas, estavam as cobiçadas perobas-rosa. Elas, ao lado dos pinheiros (araucárias), eram consideradas madeiras de lei, portanto, mais valiosas no faminto mercado madeireiro.

O que as pessoas de hoje não sabem, nem imaginam, como eram as cenas de ataques enfurecidos contra a flora. As gigantescas perobas, indefesas sem poder sair do lugar, eram colocadas abaixo sem dó nem piedade. Dependendo da espessura do tronco e da altura, eram toneladas de madeira nobre.

Ao feliz olhar dos madeireiros – que fique bem claro, os que comercializavam as madeiras e não os pobres lenhadores, que ganhavam apenas aquele magro salário que mal dava para o seu sustento – aquelas árvores valiam muito $$$. Seja depois de transformadas em madeira para construir casas, ou quando repassadas para os exportadores.

A primeira serraria – a Mineira -, o ponto de chegada das perobas gigantes depois de derrubadas nas reservas verdes dessa imensa área onde depois surgiria Umuarama e as fazendas da cafeicultura e da pecuária…

Relembrando o início: a devastação das reservas verdes e a prosperidade das novas cidades

Nesta crônica vou contar, passo a passo, como acontecia o corte delas…

O machadeiro nesse cenário dantesco era o personagem que vestia o papel de verdugo, o carrasco da devastação. Além de forte e hábil com o machado, treinava o grito de vitória sobre a vítima: “MAAAADEIRAAAAA!!!…”. Como um canto grave saindo das profundezas da garganta de um tirano, ele avisava os mateiros auxiliares – e quem estivesse de bobeira por perto – que era hora do perigo. A ordem era expressa: “Quem tem amor à vida, sai debaixo e sai de pertooo!”.

Após o berro, longo e cavernoso, seguia-se o ranger ensurdecedor da peroba-rosa tombando, como que em câmera lenta, numa espécie de gemido, acompanhado do estrondo de trovoada que fazia tremer o chão da floresta.

O curioso, e até certo ponto cômico, é que alguns desses mateiros ficaram ‘famosos’ pelo grito. Eram até imitados por outros, que não tinham o mesmo tom de voz ‘artístico’ para protagonizar aquela cena ‘guilhotinesca’ do machado descendo afiado nas entranhas das indefesas perobas.

Os viventes desta Umuarama moderna certamente nunca presenciaram nada parecido… A terra parava e, por alguns segundos de um silêncio profundo e sepulcral, todos comemoravam o fim de mais uma árvore que viveu imponente e esguia por décadas e décadas.

Na comemoração, em pose heroica, o machadeiro repetia mais um grito lancinante, que era para todo mundo ouvir o seu festejar de glória: “CAIU MAIS UUUUUMAAAAAA!!!

Além de cantar vitória, o segundo aviso servia para tranquilizar o resto da turma de que não havia mais perigo, todos podiam se aproximar sem medo de ser triturados por um pesado tronco de madeira ainda sangrando seiva verde. A peroba estava lá estendida, sem sequer poder chorar a sua agonia, sobre as folhagens rasteiras esmagadas por ela.

Impressionante esta imagem: uma vasta área coberta de perobas à espera de virares tábuas e outros produtos para a construção de residências e casas comerciais

A derrubada de uma peroba gigante era um espetáculo arrepiante!!!

A descida da vertical para a horizontal de uma árvore daquela, com 30 a 35 metros de altura, era algo espantoso, até mesmo para aqueles trabalhadores calejados na profissão do desmate. A velocidade a cada segundo, multiplicada pelas toneladas de peso, causava outro estrago ainda maior: todas as árvores vizinhas, de todos os tamanhos, eram destruídas também, pois não suportam o peso daquela gigante. Algumas eram trucidadas em mil pedaços, soltando estilhaços por todos os lados, como uma granada explodindo!

Esse é um dos motivos pelo qual o machadeiro gritava para alertar os companheiros de tarefa dos riscos daquele momento pavoroso. Da mesma foram pulverizados os ninhos de aves que estavam nas árvores vizinhas.

E havia ainda uma cortina de pó resultante da queda da peroba ao chão, levantando milhares de folhas secas e de terra bolorenta de anos de sombra e umidade. Sentia-se um odor de folhas apodrecidas, misturado ao perfume das cascas de árvores que são rachadas pela companheira vítima do machado. Mesmo com detalhes, contar aqui a cena real da derrubada de uma árvore desse porte é tarefa impossível… Afinal, mesmo sendo flora e não humano, uma árvore é um ser vivo!!!

A seguir, a ‘tigrada’ se preparava para limpar a área ao redor da árvore cortada. Com foices e facões, tiravam a galhada caída das árvores atingidas ao redor. Depois entravam em ação os “toradores”, aqueles indivíduos aos quais cabia a missão de serrar o tronco da peroba-rosa em pedaços (toras), depois de terem sido descascados.

Leia também: Sua alteza a peroba, rainha absoluta das florestas que não existem mais em Umuarama!

Depois da completa derrubada das florestas veio mais uma tarefa impiedosa: as queimadas para limpar o território de matagais, plantas menores e todos os tipos de espécies de flora rastejante que não era usada em fabricação de madeiras…

Toras de madeira enchiam os caminhões

Feito esse trabalho, as toras estavam prontas para o “arraste”. Eram atadas a um gancho, na ponta de uma grossa corrente de ferro ligada a uma roldana de um motor sobre a carroceria de um caminhão, que a puxava lentamente para cima do veículo – o famoso ‘caminhão de tora’!

Dali o próximo destino seriam as serrarias, onde a árvore fatiada seria completamente retalhada em tábuas e vigas de todos os tamanhos. Quando os caminhões não tinham motor para suspender os troncos, usavam cavalos ou bois para fazer o serviço, atrelados a correntes ou cabos de aço presos a uma roldana. Uma luta titânica para aqueles pobres animais… Se não houvesse animais, os próprios homens eram obrigados a fazer o serviço usando alavancas de pau ou ferro.

Para a entrada e saída dos caminhões de transportes de toras na floresta, eram abertos “carreadores”. Um tipo de trilha mais larga, que seguia para as estradas e, depois, para as serrarias. Como o terreno era acidentado demais dentro das reservas verdes, os motores dos caminhões antigos rugiam, soltando nuvens de fumaça azul escura e fétida de óleo diesel. Mas, ziguezagueando, venciam qualquer obstáculo…

Para que os caros leitores possam imaginar como era essa luta de homem versus natureza, me permitam detalhar que o retumbante tombo de uma árvore como essa era algo impressionante. Tal estrondo só imitado pelos efeitos especiais em filmes de guerra: consistia em três fases, a meia-direita, a meia-esquerda e a direita.

O de meia, um tombo manso, pranchado, que era o preferido dos derrubadores. A direção, direita ou esquerda, dependia do terreno ou da inclinação da peroba. O direto, ou tombo geral, era forte, estrondoso e perigoso! É que a árvore estava sujeita a dar um “coice” violento, atingindo o machadeiro.

Muitas árvores de grande porte, que não eram preferidas da indústria madeireira, ficaram em pé mas foram “exterminadas” pelas queimadas. Enfim, das floresta não se salvou nada…

A devastação das reservas verdes também fez vítimas (além das árvores)

Muitos acidentes ocorriam. Diziam até que alguns foram vítimas e ficaram inválidos pelo resto da vida!
Era preciso prevenir-se para evitar tragédias: o cortador tinha que fazer o meio tombo, ou seja, “embarrigar” o tronco um pouco abaixo da linha de corte e depois começar a serrar exatamente pelo lado oposto à “barriga” (espécie de cova feita com o machado e que marcava a direção do tombo).

Outra regra era “cintar” o tronco, quer dizer, tirar a casca numa faixa de uns vinte centímetros de largura, em forma de anel ao redor do tronco. A prática servia para marcar a linha do corte com a serra, senão ela ficaria presa à madeira e quebraria.

Machadeiros, ‘toreiros’ e outros trabalhadores que faziam da devastação da reserva verde seu ofício, repito, ganhavam salários insignificantes se levados em conta os riscos e o trabalho bruto e cansativo que executavam para as firmas de extração e beneficiamento de madeiras.

Cidadãos de nenhuma letra, estavam sujeitos a esse tipo de tarefas perigosas, correndo até mesmo risco de morte num acidente durante o trabalho. Mas, desde que o mundo é mundo, alguém tem que fazer esses serviços para poder sobreviver, afinal nesta vida não existe almoço grátis… (ITALO FÁBIO CASCIOLA, Especial para OBEMDITO)

Ítalo Fábio Casciola

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