Foto: Danilo Martins/OBemdito

Política

Justiça determina suspensão da comissão processante contra o prefeito Celso Pozzobom

Decisão saiu nesta tarde de quinta-feira

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Justiça determina suspensão da comissão processante contra o prefeito Celso Pozzobom
Redação
OBemdito
24 de junho de 2021 15h58

A juíza Sandra Lustosa Franco determinou a suspensão da comissão processante instaurada na Câmara de Vereadores contra Celso Pozzobom (PSC), que poderia resultar na cassação do mandato do prefeito. A decisão saiu na tarde desta quinta-feira (24).

Neste caso os réus são a Câmara de Vereadores e o presidente Fernando Galmassi (PSC), que segundo a defesa do prefeito não respeitou as regras de tramitação dentro da Casa.

A defesa diz que houve “inobservância do prazo estabelecido na legislação para a votação da instalação da Comissão Processante, fazendo com que os Vereadores tenham tido apenas 17 segundos para analisar cada página do documento protocolado na Câmara antes de votá-lo; afronta à imparcialidade dos Vereadores escolhidos para a composição da julgadora Comissão Processante, na medida em que todos os seus três componentes integram, simultaneamente, a investigativa Comissão Parlamentar de Inquérito que igualmente tramita no Legislativo; e ausência da inclusão do tema na Ordem do Dia.”

A sessão que culminou nesta instauração da comissão teve presença de público e o presidente da Câmara optou por dar sequência ao processo, embora essa não tenha sido a motivação que determinou a decisão da magistrada.

Ela entendeu que os prazos e o rito seguido na leitura, votação e recebimento da denúncia estavam de acordo com o regimento interno da Câmara, mas a composição dos membros, não (veja a decisão completa abaixo).

A Procuradoria Jurídica da Câmara, representada pelo advogado Diemerson Castilho, protocolou junto à Vara da Fazenda, na noite da última de terça-feira (22), apresentação de argumentos introdutórios, a qual reforçou serem inexistentes os requisitos para o deferimento da tutela de urgência protocolada pela defesa de Pozzobom.

Apesar da batalha jurídica, a juíza, em sua decisão disse que concedia “a liminar pretendida, para o fim de determinar a suspensão da Comissão Processante instituída pela Câmara de Vereadores de Umuarama, no dia 07/06/2021, até o julgamento final desta demanda”.

Leia a íntegra da decisão abaixo:

Autos nº 0006964-22.2021.8.16.0173

Autor: Celso Luiz Pozzobom

Réus: Câmara Municipal de Umuarama-PR e Fernando Galmassi

DECISÃO

1. Trata-se de ação anulatória proposta por Celso Luiz Pozzobom

em face da Câmara Municipal de Umuarama-PR e de Fernando Galmassi, alegando, em síntese, que é réu em processo de cassação instaurado perante o Poder Legislativo Municipal, cuja votação de instalação da Comissão Processante padeceu das seguintes nulidades:

(i) inobservância do prazo estabelecido na legislação para a votação

da instalação da Comissão Processante, fazendo com que os Vereadores tenham tido apenas 17 segundos para analisar cada página do documento protocolado na Câmara antes de votá-lo; (ii) afronta à imparcialidade dos Vereadores escolhidos para a composição da julgadora Comissão Processante, na medida em que todos os seus três componentes integram, simultaneamente, a investigativa Comissão Parlamentar de Inquérito que igualmente tramita no Legislativo; e (iii) ausência da inclusão do tema na Ordem do Dia, defeito menos grave, mas que indica a incompatível pressa para apreciar votação de tema tão sensível.

Requereu a concessão de liminar, a fim de suspender imediatamente o trâmite do processo de cassação, até o final julgamento desta demanda, quando deverá ser declarada a nulidade da constituição da comissão processantes e de todos os atos decorrentes.

Juntou documentos (seqs. 1.2-1.30).

A Câmara Municipal de Umuarama apresentou manifestação a respeito do pedido de suspensão da comissão processante no seq. 29.1, alegando, em síntese, que: a) não houve ilegalidade quanto à votação do recebimento da denúncia, porque a exigência de inclusão na pauta, no interstício mínimo de 24 horas anterior ao seu início, não se coaduna com o rito especial do processo de cassação do prefeito; b) legalidade da votação da admissibilidade da denúncia na mesma sessão do seu recebimento; c) não há impedimento de participação de um mesmo vereador na comissão de investigação e na comissão processante, porque não há previsão legal nesse sentido e a atuação parlamentar é baseada em convicções político-partidárias, a qual não se equipara à função judicante, que deve ser sempre imparcial; e) o relator da Comissão Parlamentar de Inquérito não integra a Comissão Processante, de modo que o caso dos autos não guarda similitude fática com o do Acórdão apresentado pelo autor para justificar o alegado impedimento.

Requereu o indeferimento da tutela de urgência.

Juntou documentos (seqs. 29.1-29.6).

O autor apresentou réplica no seq. 31.1, refutando as alegações da

ré e repisando os termos da inicial. Vieram-me os autos conclusos. Decido.

2. Para a concessão do pedido, mostra-se necessária a presença dos

requisitos insculpidos no art. 300 do CPC, que assim disciplina:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver

elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de

dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§ 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o

caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos

que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada

se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após

justificação prévia.

§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida

quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

Como se vê, por força no dispositivo em tela, não se defere a

antecipação da tutela se não houver prova convincente da verossimilhança da alegação do autor, fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação e possibilidade de se reverter os efeitos do provimento antecipado.

No caso dos autos, em análise sumária dos autos, e sem prejuízo de

alteração de entendimento por ocasião do julgamento em cognição exauriente, há parcial probabilidade do direito alegado pelo autor.

De início, importa destacar que, assim como no processo judicial, no

processo administrativo a alegação de nulidade só pode ser acolhida se a parte demonstrar, efetivamente, a ocorrência de prejuízo ao bem tutelado pela inobservância da forma legal.

Trata-se da aplicação, ao processo administrativo, do princípio pas

de nullité sans grief (não há nulidade sem prejuízo), segundo o qual, não se há falar em nulidade do procedimento quando o objetivo tutelado pela norma violada for alcançado, mesmo que por outra maneira.

Esse entendimento é sufragado pelo Superior Tribunal de Justiça,

consoante se infere da seguinte emenda:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. ALEGAÇÃO DE

NULIDADE DO PAD. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO EVIDENCIADO

PELOS DOCUMENTOS TRAZIDOS NA INICIAL. AUSÊNCIA DE DIREITO

LÍQUIDO E CERTO. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM.

ORDEM DENEGADA. 1. Aos impetrantes foram aplicadas as penas de

demissão e de suspensão por terem liberado Autorização para

Transporte de Produto Florestal (ATPF) utilizando documentação fraudulenta. 2. Conforme se depreende do relatório final da Comissão

processante, o material probatório colhido no decorrer do processo

administrativo disciplinar (oitiva de 15 testemunhas, vistoria in loco e

apresentação e apreciação das defesas escritas dos impetrantes) e a

motivação da punição autorizam a aplicação da sanção de demissão,

sendo certo que o procedimento punitivo aparenta regularidade

procedimental. 3. Segundo o princípio pas de nullité sans grief, a

nulidade do processo administrativo disciplinar somente pode ser

declarada quando houver efetiva demonstração de prejuízo à defesa

do servidor acusado, o que, contudo, não se configura na hipótese

dos autos. 4. É dispensada a intimação pessoal do servidor

representado por advogado, sendo suficiente a publicação da decisão

proferida no PAD no Diário Oficial. 5. Ordem denegada, em

consonância com o parecer ministerial. (MS 9.699/DF, Rel. Ministro

ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em

28/11/2018, DJe 11/12/2018)

A propósito, oportuna a lição de Marçal Justen Filho, em sua obra

Curso de Direito Administrativo, 8ª ed., São Paulo: Malheiros, p. 323/324:

A nulidade deriva da incompatibilidade do ato concreto com valores

jurídicos relevantes. Se certo ato concreto realiza os valores, ainda que

por vias indiretas, não pode receber tratamento jurídico equivalente ao

reservado para atos reprováveis. Se um ato, apesar de não ser o

adequado, realizar as finalidades legítimas, não pode ser equiparado a

um ato cuja prática reprovável deve ser banida. A nulidade consiste

num defeito complexo, formado pela (a) discordância formal com um

modelo normativo e que é (b) instrumento de infração aos valores

consagrados pelo direito. De modo que, se não houver a consumação

do efeito (lesão a um interesse protegido juridicamente), não se

configurará invalidade jurídica. Aliás, a doutrina do direito

administrativo intuiu essa necessidade, afirmando o postulado de pas

de nullité sans grief (não há nulidade sem dano).

Dessa forma, a declaração de nulidade do processo administrativo

por inobservância dos termos estritos da lei depende da demonstração de que o ato comprometeu efetivamente a defesa de quem a alega, não comportando acolhimento quando a finalidade do processo for alcançada por forma diversa.

Estabelecida esta premissa, é possível concluir que a não observância

do interstício mínimo de 24 horas para submissão do requerimento, não incluído na ordem do dia, à apreciação do plenário, não gerou a nulidade da formação da Comissão Processante, na medida em que não houve prejuízo ao direito de defesa do autor.

A propósito, a necessidade de inclusão da denúncia em pauta se trata

de regra de funcionamento interno da Câmara, que deve ser observada previamente à notificação do réu para se defender da acusação, não irradiando nenhum efeito sobre os prazos de manifestação e produção de provas da defesa.

Não bastasse isso, a denúncia, embora possa ser considerada uma

proposição, não precisa ser incluída na pauta no prazo mínimo de 24 horas anterior ao seu início, porque o art. 226 do Regimento Interno da Câmara, estabelece que a leitura da denúncia e a votação sobre o seu recebimento deverão ser realizadas na primeira sessão após o Presidente estar de posse da denúncia.

Assim sendo, como o Presidente da Câmara recebeu (seq. 1.10) o

requerimento no dia 02/06/2021, antes, portanto, da sessão do dia 07/06/2021, totalmente correto o ato de discussão a respeito da proposição naquela sessão, independentemente de não ter sido incluído na pauta respectiva (seq. 1.19), já que o rito específico para a hipótese de julgamento de prefeito não exige tal formalidade.

Na mesma linha, não se acolhe a alegação de ilegalidade da votação da

admissibilidade da denúncia na mesma sessão, porque, conforme afirmado acima, tal sequência de atos encontra previsão no regimento interno da Câmara, bem como no art. 5º, inciso II, do Decreto-Lei nº 201/67, o qual assim preceitua:

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE

Art. 5º O processo de cassação do mandato do Prefeito pela Câmara,

por infrações definidas no artigo anterior, obedecerá ao seguinte rito,

se outro não for estabelecido pela legislação do Estado respectivo:

(…)

II – De posse da denúncia, o Presidente da Câmara, na primeira sessão,

determinará sua leitura e consultará a Câmara sobre o seu

recebimento. Decidido o recebimento, pelo voto da maioria dos

presentes, na mesma sessão será constituída a Comissão processante,

com três Vereadores sorteados entre os desimpedidos, os quais

elegerão, desde logo, o Presidente e o Relator.

Portanto, a despeito do procedimento veiculado pela imprensa (seq.

1.29) ou de entendimentos em sentido contrário, o fato é que o procedimento adotado está em consonância com as normas procedimentais que regulam o processo de cassação do prefeito, não havendo nulidade a ser declarada. Por outro lado, com relação ao impedimento dos vereadores integrantes da comissão processante, há probabilidade do direito do autor de obter a anulação do processo de cassação, uma vez que todos são integrantes da Comissão Parlamentar de Inquérito (seq. 1.21), instaurada para apurar os mesmos fatos que serão

abordados no julgamento político, situação esta que afasta a necessária isenção e imparcialidade na apreciação dos fatos, vulnerando os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Nessa linha, às decisões jurisprudências apresentadas na inicial,

somam-se as seguintes: Apelações cíveis. Ação de nulidade de ato legislativo. Litispendência e cerceamento de defesa. Inocorrência. Processo político administrativo. Cassação de prefeito municipal. Participação do mesmo vereador na Comissão Parlamentar de Inquérito e na Comissão Processante. Isenção e imparcialidade inexistentes. Falta

de observância do devido processo legal. Nulidade ocorrente.

Recursos não providos. (…) 5. O processo político administrativo para cassação de Prefeito Municipal deve estar isento de irregularidades formais. 6. Qualquer cidadão tem o direito ao devido processo legal

com o contraditório e a ampla defesa. 7. O devido processo legal deve

ser observado no processo político administrativo. Os julgadores

devem ser imparciais e isentos no julgamento dos ilícitos

administrativos. 8. A falta de integral observância do princípio

constitucional do “”due process ofl aw”” invalida o processo político

administrativo. 9. A participação de alguns vereadores na Comissão

Parlamentar de Inquérito e na Comissão Processante, instauradas

pelo mesmo fato, retira a imparcialidade e isenção no julgamento.

Esta circunstância lesa o princípio do devido processo legal. 10.

Apelações cíveis conhecidas e não providas, rejeitadas duas

preliminares. (TJ-MG 101930300765020071 MG 1.0193.03.007650-

2/007(1), Relator: CAETANO LEVI LOPES, Data de Julgamento:

24/05/2005, Data de Publicação: 10/06/2005)

REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. COMISSÃO

PARLAMENTAR PROCESSANTE. NULIDADE. VÍCIO NA INSTALAÇÃO DA

COMISSÃO E NA FORMAÇÃO DE SEUS MEMBROS. CERCEAMENTO DE

DEFESA. É nula a Comissão Parlamentar Processante – CPP – que tem

como presidenta vereadora relatora de precedente Comissão

Parlamentar de Inquérito – CPI, cujo objeto era a investigação da

maioria dos fatos examinados pela CPP. Sentença mantida. Análise das

demais questões aventadas prejudicada. EM REEXAME NECESSÁRIO,

SENTENÇA MANTIDA. (Reexame Necessário Nº 70044060606, Segunda

Câmara Cível – Serviço de Apoio Jurisdição, Tribunal de Justiça do RS,

Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em 08/05/2013)

Portanto, há verossimilhança da alegação de impedimento dos

membros da comissão processante, ainda que não sejam relatores da CPI, já que a cumulação das funções de investigação e responsabilização do denunciado não garante a necessária imparcialidade na condução do processo, tornando-o nulo.

A par disso, o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação também está presente, uma vez que a continuidade dos atos da comissão processante poderá acarretar na cassação do mandato do autor, bem como tornar ineficaz eventual sentença de procedência, considerando que o feito pode transitar em julgado muito tempo depois da decisão final do processo legislativo.

3. Pelo exposto, CONCEDO a liminar pretendida, para o fim de

determinar a suspensão da Comissão Processante instituída pela Câmara de Vereadores de Umuarama, no dia 07/06/2021, até o julgamento final desta demanda.

Intimem-se.

Umuarama, datado e assinado eletronicamente.

SANDRA LUSTOSA FRANCO

Juíza de Direito Substituta

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